Por que Gary Gensler deveria continuar na presidência da SEC?

quem é Gary Gensler

Diante das recentes investidas da SEC contra o ecossistema de criptoativos nos Estados Unidos, Gary Gensler, presidente do órgão, tem roubado a cena e ganhado as manchetes das reportagens sobre o assunto. No último dia 12, o congressista Warren Davidson apresentou o “SEC Stabilization Act” na House of Representatives, onde uma das principais disposições do projeto de lei é justamente demitir o mandatário da “CVM norte-americana”. Nas palavras de Warren:

“Os mercados de capitais dos EUA devem ser protegidos de um presidente tirânico, incluindo o atual. É por isso que estou apresentando uma legislação para corrigir o abuso contínuo de poder e garantir proteção que esteja no melhor interesse do mercado nos próximos anos. É hora de uma reforma real e de demitir Gary Gensler como presidente da SEC.”

Mas por qual motivo Gensler tem atuado de forma tão assertiva e, por vezes, arbitrária? Será que sempre foi assim? Para (tentar) entender as motivações que embasam a linha de raciocínio de Gary, portanto, é crucial conhecermos sobre sua história. Este artigo tem por objetivo, portanto, mostrar quem é Gary Gensler, o que ele pensa, e explicar por que ele deveria permanecer no cargo para o bem das criptomoedas.

 

Quem é Gary Gensler?

Gary Gensler, atual presidente da SEC, é reconhecido como um regulador gabaritado e com profundo entendimento da complexa engrenagem que impulsiona as finanças globais. Nascido em 18 de outubro de 1957, é natural de Baltimore, no estado de Maryland, nos Estados Unidos. Bacharel em economia e mestre em administração de empresas pela Wharton School da Universidade da Pensilvânia, conta com uma formação acadêmica e experiência profissional sólidas e impressionantes, o que respaldam seu background no mundo das finanças.

Gensler começou sua carreira no Goldman Sachs, onde trabalhou por 18 anos no departamento de fusões e aquisições (M&A), chegando a ser Head de finanças. Por lá, desenvolveu um amplo entendimento dos mercados financeiros e das operações de Wall Street. Após isso, ingressou no setor público e atuou, primeiramente, no Departamento do Tesouro norte-americano durante o governo de Bill Clinton, onde lidou com questões relacionadas à política econômica e aprimorou ainda mais seu entendimento entre a interação dos mercados financeiros com a regulação governamental, contribuindo para a reforma financeira da época.

Sua carreira no setor público, então, deu mais um passo quando foi nomeado presidente da Commodity Futures Trading Commission sob a presidência de Barack Obama. Nessa função, desempenhou papel fundamental na implementação da Dodd-Frank Act, uma legislação promulgada em resposta à crise financeira de 2008 com o objetivo de reduzir os riscos no sistema financeiro dos Estados Unidos. Crise essa, diga-se de passagem, que incentivou Satoshi Nakamoto a criar o Bitcoin com o mesmo objetivo.

Nesse cargo, Gensler demonstrou seu compromisso em criar estruturas regulatórias sólidas para proteger os consumidores e manter a integridade dos mercados financeiros. Sua experiência na CFTC propiciou insights que ele trouxe agora para o primeiro plano de regulação das criptomoedas como presidente da SEC.

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Nomeação como presidente da SEC

A nomeação de Gary como presidente da SEC em 2021 marcou um momento importante de interseção entre finanças e tecnologia nos Estados Unidos. Biden tinha como objetivo nomear um especialista experiente em finanças que também tivesse vasto conhecimento de economia e tecnologias digitais, motivo pelo qual a indicação foi amplamente aprovada.

Assim, podemos dizer que o nome de Gensler foi responsável por sinalizar uma intenção do órgão em estabelecer regulamentações mais claras para o mundo das criptomoedas, demonstrando interesse do governo em navegar pelos mares da inovação financeira.

Portanto, imbuído da responsabilidade de fazer cumprir as leis de valores mobiliários no intuito de garantir mercados mais justos e eficientes, esperava-se de Gary uma liderança que também buscasse o equilíbrio na promoção dessa inovação.

É claro e inegável, lógico, que sabemos que apesar do potencial transformador das criptomoedas, também há riscos associados aos ativos digitais, de forma que Gary precisaria se debruçar especialmente no que diz respeito à proteção dos investidores e à integridade do mercado.

E isso era totalmente esperado desde a sua nomeação. É ingenuidade acreditar que não havia qualquer regulação no setor. Aqui no Hub, sempre defendemos que houvesse uma regulação oportuna desde que fosse bem feita e não impedisse os avanços tecnológicos.

Ou seja, não é uma grande novidade que, dado seu histórico rigoroso com o Dodd-Frank Act no compromisso de uma supervisão financeira sólida nos EUA, Gary provavelmente não seria menos criterioso com as criptomoedas.

No entanto, o que se esperava era uma condução firme, coerente e segura no ambiente digital, algo que não temos visto acontecer vindo de alguém com amplo conhecimento tanto em commodities, quanto em valores mobiliários e blockchain. Sim, blockchain. Gary lecionou no curso “Blockchain and Money” do MIT em 2018.

Não à toa, enquanto assistia às suas aulas, lembro nitidamente da seguinte frase: três quartos do mercado são de não-securities, são somente commodities, são cash cryptos”. Ainda bem que existe a internet para imortalizar esses momentos.

O que mudou então, Gary? E ainda que estivesse se referindo a BTC e ETH representando 75%, onde ambos, à época, utilizavam o mecanismo de Proof-of-Work, vale ressaltar que Gensler, em manifestações mais recentes nas investidas da SEC contra Binance e Coinbase, poupou o ether mesmo com a mudança de consenso para Proof-of-Stake.

Gary Gensler

 

Não parece, agora, estar havendo uma interpretação deturpada do Howey Test para forçar a classificação de diversos criptoativos como securities em uma guinada brusca de direção por parte de Gary e companhia?

Afinal, o que diferencia o ETH de outras moedas citadas?

E, mais do que isso, o que há de comum entre os ativos?

Escrevemos um outro artigo onde abordamos algumas dessas questões e o quanto os EUA estão afugentando capital de uma indústria extremamente potente para concorrentes geopolíticos, clique abaixo e leia na íntegra:

Como a investida da SEC vai impactar o mercado crypto e porque os EUA estão dando um “tiro no pé”

 

 

Uma das curiosidades disso tudo é que, em 2019, Gary se “ofereceu” para ser um consultor da Binance.

Já em março de 2022, Gary teve uma reunião com o magnata da FTX, Sam Bankman-Fried, sem aprovação prévia da equipe de ética da SEC, violando o protocolo da agência e levantando suspeitas, supostos conflitos de interesse e relações estreitas com SBF.

As informações são oriundas de um documento revelado recentemente que foi obtido por meio da Lei de Liberdade de Informação. Vale lembrar que Mark Wetjen, então lobista da FTX, foi comissário da Commodity Futures Trading Comission (CFTC) ao mesmo tempo em que Gary era presidente do mesmo órgão.

Membros republicanos do Congresso, incluindo o presidente do Comitê de Serviços Financeiros da Câmara, Patrick McHenry, também criticaram Gensler e exigiram mais informações sobre as relações com SBF e a FTX.

Já o congressista Thomas Earl Emmer classificou as reuniões de Gensler como “negociações nos bastidores com pessoas em atividades nefastas”. Vale lembrar, à título de curiosidade, que SBF esteve entre os maiores doadores de campanha nas eleições mid-term dos EUA.

As revelações levantaram preocupações sobre a conduta de Gary e sua suposta falta de transparência e ética no exercício do mandato como presidente da SEC, principalmente pela aparente estreita relação com o protagonista de uma das maiores fraudes financeiras da história.

Enquanto isso, diversas empresas sérias de criptomoedas têm tentado, há meses, obter uma reunião com a SEC, sem sucesso. Inúmeros são os agentes que já se manifestaram anteriormente pedindo que o órgão fornecesse orientações regulatórias claras para que pudessem operar. Desejo que não só não foi atendido por Gary, como ainda se virou contra as próprias exchanges.

Diante de tudo o que se vê, desde o sufocamento financeiro feito pelos órgãos estatais norte-americanos para impedir a entra de capital no ambiente crypto desde o início do ano com os bancos “crypto-friendly” sendo obrigados a cumprir sanções extremamente desmedidas e desproporcionais, parece que a “guerra às cryptos” é a pauta principal da agenda, doa a quem doer. E, para isso, utilizam-se os mais variados argumentos e pretextos possíveis.

Uma saída de Gensler da presidência poderia abafar as tramas dos bastidores que, ao que tudo indica, podem ser muito mais preocupantes do que conseguimos enxergar.

 

Talvez, a melhor alternativa, politicamente falando, seja deixar Gary desgastando sua imagem na presidência da SEC, mantendo vivas as evidentes contradições do presidente do órgão e fortalecendo a imagem do ecossistema crypto e descentralizado.

 

Caio Goetze

Formado em Direito pela PUC-RJ e pós-graduando em Direito Digital pelo Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS) em parceria com a UERJ, conta com 3 anos de experiência e diversos cursos de formação acadêmica de bagagem no “criptomercado”.

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