O que mudou na Ethereum em 1 mês desde o The Merge?

Ethereum

Há exatamente um mês, vivíamos a ansiedade das horas que antecediam o The Merge na Ethereum, atualização responsável por alterar o mecanismo de consenso da rede de Proof-of-Work para Proof-of-Stake, diminuindo o consumo energético em mais de 99.95% e pavimentando o caminho para futuros upgrades voltados para aumentar o número de transações por segundo (TPS), gerando escalabilidade. Uma série de discussões e debates sobre os benefícios da atualização passaram a ser levantados. O que será que aconteceu neste 1 mês?

 

1) Diminuição no gasto energético

Uma boa analogia para o Proof-of-Work é pensar em cadeados com sequências numéricas. Não existe uma fórmula matemática que, se resolvida, seja capaz de abrí-lo. O único modo, portanto, é tentar insistentemente descobrir a ordem correta experimentando diferentes combinações.

Tecnicamente falando, os mineradores precisavam acertar, por meio de tentativa e erro, qual o valor “nonce” que geraria um valor “hash” específico com uma certa quantidade de números zero no início.

E é aí que o fator “consumo energético” entrava em jogo para nutrir esse processamento responsável por ficar realizando os “chutes”, demandando o uso de computadores super potentes e especializados. Tudo isso dentro de um ambiente de competição entre os mineradores para ver quem conseguiria realizar o processo primeiro. Agora, ao abandonar a mineração, a Ethereum deixa de lado esse mecanismo e adota um modelo de rede mais energeticamente eficiente e ecologicamente sustentável, por assim dizer.

Em síntese, podemos dizer que antes a rede era garantida por recursos energéticos e, agora, em Proof-of-Stake, passa a ser garantida por recursos financeiros uma vez que depende do bloqueio (“staking”) de recursos.

Justin Drake, um pesquisador da Ethereum Foundation, estimou que essa alteração reduziria o consumo global de energia em 0.2%.

O que será que conseguimos ver desde já?

De acordo com o Digiconomist, plataforma disponibilizada no próprio site da Ethereum, observamos que até o dia 14 – um dia antes da modificação, portanto – a rede consumia aproximadamente 77 TWh por ano, valor que caiu drasticamente dali em diante para atuais 0.01 TWh/ano.

consumo de energia Ethereum

Fonte: Digiconomist – Ethereum.org

 

Para efeitos de comparação, lembro que realizamos uma live para nossos assinantes no dia 07 de junho onde o consumo energético da Ethereum era de 91 TWh/ano, comparável ao das Filipinas à época. Enquanto isso, a pegada de carbono estava na casa de 51.01 Mt CO2/ano, próxima à da Suécia.

Atualmente, pós-Merge, a comparação factível é a seguinte:

consumo energético Ethereum pegada de carbono Ethereum

Fonte: Digiconomist – Ethereum.org

 

2) Redução na emissão e supply

O impacto mais interessante que podemos ver após o Merge é na taxa de emissão de ETH. No mecanismo de Proof-of-Stake, não há mais geração de ethers (ETH) para recompensar mineradores, como havia em Proof-of-Work, havendo um corte de aproximadamente 90% nessa emissão somente a partir desta perspectiva, o que equivale a três halvings do Bitcoin de uma só vez.

Aliado a este fator, temos ainda o mecanismo de queima de tokens (“base fee”), que depende da atividade na rede,  introduzido pela atualização EIP-1559 desde antes do Merge. Essa conjuntura de fatores pode tornar a Ethereum deflacionária com o tempo.

De forma simplificada, podemos dizer que a emissão de ETH agora depende do total de ETH em stake, enquanto a queima depende do quanto a rede está sendo usada. Assim, quanto maior for a Base Fee, mais próximo da deflação.

Neste um mês, constatamos que a rede reduziu drasticamente (mais de 98%) a quantidade de novos ethers (ETH). Vamos comparar a emissão atual pós-Merge com a simulação da emissão caso não tivesse ocorrido a mudança:

  • Emissão Pós-Merge (Proof-of-Stake): Novos 6.919,93 ETH foram emitidos.
  • Projeção da emissão sob Proof-of-Work: Novos 354.911,12 ETH teriam sido emitidos caso o mecanismo de consenso permanecesse o mesmo de antes.

 

Abaixo, o gráfico comparativo entre o supply de três cenários:

  • Em branco-tracejado a quantidade de Ethers (ETH) que teriam sido emitidos sob Proof-of-Work.
  • Em laranja, a emissão de novos bitcoins e
  • Em azul, a emissão de novos ETH sob Proof-of-Stake após o The Merge.

supply da Ethereum de três cenários

Fonte: ultrasound.money

 

Ao olharmos somente para o supply da Ethereum pós-Merge, no entanto, vemos ainda que em pouquíssimos dias, a queima de ETH “zerou” a inflação gerada nas duas semanas anteriores. Isso com a atividade da rede ainda em patamares baixíssimos em razão do contexto de “bear market”. Veja abaixo:

Fonte: ultrasound.money

 

Proof-of-Stake: Ao projetar esses dados e simular um cenário onde os últimos 435 dias tivessem sido sob Proof-of-Stake, por exemplo, constatamos que o crescimento do fornecimento de ETH (“supply growth”) totalizaria 1.33% negativos ao ano, atingindo deflação a partir de uma baixa emissão (603K ETH/ano) e da queima de ETH (2.237K ETH/ano).

Proof-of-Stake

Fonte: ultrasound.money – Proof-of-Stake

 

Já em Proof-of-Work, o crescimento do fornecimento seria de 2.19% positivos no mesmo período em função da altíssima emissão de 4.931K ETH/ano.

Proof-of-Work

Fonte: ultrasound.money – Proof-of-Work

 

3) Validadores

Com o abandono do sistema de mineradores, a Ethereum passou a adotar novos agentes responsáveis por manter a cadeia operando de forma íntegra: os validadores.

Já abordamos em outro artigo as discussões acerca da possível centralização que o Merge poderia gerar. Caso tenha interesse sobre o tema, recomendamos a leitura!

 

No entanto, resolvemos trazer novas questões à mesa para sanar quaisquer dúvidas.

Durante o mês, uma matéria afirmando que apenas 2 endereços seriam responsáveis por controlar 46% de todos os nodes processando transações na Ethereum pós-Merge foi amplamente divulgada. Os dados são de origem da Santiment, empresa especializada em análise de cripto. Ao avaliarmos a afirmação, no entanto, vemos que a situação não é bem essa. O que o relatório fez foi rastrear as carteiras da Ethereum que receberam as recompensas das validações depois de emitidas, e não as operações desses validadores em si.

Ou seja, o estudo avaliou o que esses validadores fizeram com as recompensas que obtiveram pelo seu trabalho, constatando que houve muitos envios para as mesmas carteiras, o que não significa que esses nodes são operados pelo mesmo indivíduo. Na verdade, as três maiores carteiras (responsáveis, respectivamente, por acumular 28.97%, 16.18% e 8.32%) são justamente as carteiras que recebem recompensas da Lido, da Coinbase e da Kraken respectivamente.

 

Ethereum pos Merge inflaçãoFonte: https://finbold.com/only-2-addresses-control-46-of-all-ethereums-pos-nodes-for-processing-transactions-post-merge/

 

Esse percentual de recompensas, por sinal, é muito próximo ao percentual de penetração na rede de cada uma dessas entidades. A Lido hoje tem 30.31% do total de ethers (ETH) em stake, enquanto Coinbase tem 12.68% e Kraken 8.62%. Ou seja, dentro de um percentual de margem de erro compatível.

 

percentual de recompensas das redesFonte: https://www.rated.network/

 

Vale lembrar que Lido, Coinbase, Kraken e companhia não são os validadores em si! Atuam basicamente como pools de staking para permitir que aqueles investidores que não tem os 32 ETH necessários para o processo de validação, também consigam participar. Sendo assim, essas plataformas redirecionam os ethers (ETH) stakados pelos usuários para validadores terceirizados. E, Se observarmos mais a fundo esses terceirizados, notamos que, somente na Lido, há 28 desses validadores operando sob a essa dinâmica, e nenhum deles possui uma penetração maior do que 5.55%.

 

4) Clients e Nodes

  • Clients: Basicamente, após o Merge, os clients de consenso e execução precisam ser executados conjuntamente para que o usuário tenha acesso à rede. Hoje, temos basicamente 4 clients de execução e 5 clients de consenso em operação:

Clients ethereum 1

Fonte: https://clientdiversity.org/

 

  • Nodes: Diferentemente do que vimos acontecer na primeira semana após a atualização, o saldo do mês foi negativo (-6.78%) para o número de novos nodes na rede, caindo para 8.595 “nós” de acordo com o Etherscan. Já pelas métricas do ethernodes.org, o número é de 7.244.

Nodes ethereum

Fonte: Etherscan

Conclusão…

Após um mês de operação da Ethereum sob Proof-of-Stake, podemos observar que tudo está operando funcionalmente como o planejado. Nenhum incidente relevante, alta participação na rede (99.8%), alta redução no consumo de energia elétrica (aproximadamente 99.98%), alta queda no supply growth comparativo pós-Merge (aproximadamente 98%) e também na emissão anual comparativa entre PoW e PoS. Em contraponto, vimos uma queda no número de nodes da rede.

 

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Caio Goetze

Formado em Direito pela PUC-RJ e pós-graduando em Direito Digital pelo Instituto de Tecnologia e Sociedade (ITS) em parceria com a UERJ, conta com 3 anos de experiência e diversos cursos de formação acadêmica de bagagem no “criptomercado”.

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